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Megafauna

by Daniel Catarino

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1.
Manequim 02:40
O pescador matou a sede E arremessou a rede Para capturar Uma espécie protegida Que não foi devolvida Ao ventre do mar Tirou a fotografia Com a pescaria Em pose de sultão Ali mesmo fez o lume E grelhou o cardume Para a tripulação Fui manequim Na festa do sultão Fui manequim À proa no carvão Já chegado a bom porto Assassinou um porco Que morreu a guinchar Maçã na boca para o estilo Na foto com o filho Que chora ao mastigar Fui manequim Na grelha do sultão Fui manequim Num espeto em rotação Fui manequim Mataram-me à traição Fui manequim A tua boca é o meu caixão Fui manequim Na boca do sultão Fui manequim Só carne para canhão Fui manequim Num mundo em extinção Fui manequim O meu corpo é o teu caixão
2.
Ia assobiando o hino com afinco patriota Da janela o vizinho chamava-lhe idiota Tinha a confiança de quem não se cansa De vitórias morais De quem não trabalha mas sempre ralha Com as crises mundiais Para mim, rei só o bolo Dizia em tom de gozo Que até o mais honesto é guloso Um homem escolhe um lado, Escolhe o outro e volta ao meio A liberdade anda à vontade Mas sempre com receio Dos que agitam bandeirinhas Em tempo de eleições Que são os mesmos que protestam Quando estão em maus lençóis O governo isto e aquilo Diz o jovem e o idoso Até o mais honesto é guloso Até o mais honesto é guloso Desempregado e mal-amado Pelo próprio país Vai-se sentando Sempre esperando um dia ser feliz Critica no café Mas cala-se em frente ao patrão E o hino, só o canta Quando joga a seleção E vote em quem votar O resultado é desastroso Até o mais honesto é guloso Até o mais honesto é guloso Chega à reforma já em coma físico e mental Telefona à família pelos dias de Natal Vai ouvindo a crise pelo que dizem Nas notícias na rádio E ao domingo Gasta o dinheiro da reforma no estádio Já senil e marreco Vai ralhando em tom nervoso Que um político é mais contagioso Que dar um beijo na boca a um leproso E até o mais honesto é guloso E até o mais honesto é guloso
3.
Sentava-me em frente ao caixão De um velho cão sem sepultura Tinha uma pedra sem inscrição Fotografia sem moldura Sentava-me em frente ao caixão De um gato que ainda vivia E quanto mais o enterravam Mais o seu miado se ouvia Sentava-me em frente ao caixão De um boi sem cornos e capado Alguém com uma farpa na mão Jazia morto a seu lado Sentava-me em frente ao caixão De uma cadela ainda prenha E enquanto ela dava à luz Usaram o caixão como lenha O fogo ardeu por todo o ano E eu fui ladrando até ser cão Mal dei por mim estava às escuras Deitado dentro do caixão Mal dei por mim estava às escuras Deitado dentro do caixão
4.
BERÇO DE OURO Piso no cravo do bom português Sou um escravo com um tique burguês Em vez de pobre, fechado no nada Quero ser rico, viver na fachada Estou calado, deixo o vinho falar Afundando qual âncora no mar Antes ter casa que saber onde moras Contar pertences, não o passar das horas Eu não nasci em berço de ouro Não tenho terra, cavalo nem touro E preciso de soro Deixei um bom emprego na Irlanda Escrevi canções, formei uma banda Mas as cantigas não pagam salário Ouve o que digo mas faz o contrário Vivo no limite, já ganhei calo Faço biscates pela porta do cavalo Não tenho herança, não tenho subsídio Mais valia abrir um clube de vídeo Eu não nasci em berço de ouro Não tenho terra, cavalo nem touro E preciso de soro A distância deixa sempre mazela Vou de barco a servir de vela Roçando nos sonhos que tinha De ponta-de-lança passei a bandeirinha Sou mealheiro num mundo de bancos A coxear ao lado dos mancos Vou ser cremado, virar pó nas estantes Qual estrangeiro num mundo de emigrantes Eu não nasci em berço de ouro Não tenho terra, cavalo nem touro E preciso de soro
5.
Anda fugir Anda fugir do tempo morto que é dormir Que é dormir dentro do lodo Arrependido Daquilo que não se cumpriu E ao fugir Ficou por inventar o fogo Além de tudo por fazer Anda fugir Anda fugir do tempo morto Ampulheta Mão no caixão E o corpo a devolver Sonhos sem objectivos Antes chover Um vendaval de amarguras Do que chorar A procurar o que descuras Tudo é falível menos aquilo que falhou Ampulheta Mão no caixão E o corpo a devolver Sonhos sem objectivos Sangrei o caminho das estrelas O sangue brilha à luz das velas Na chama A bússola a girar Aponta Fora do radar E o tempo morto a renascer Ampulheta Mão no caixão E o corpo a devolver
6.
Fodidos 02:50
É pró menino e prá menina Sob torres de vigia Logo na ecografia Estão fodidos É pró menino e prá menina Caderno e pistola Na mochila da escola Estão fodidos Anda limpar a testa do visor São gotas de suor Com toalhas por vender Deixa lá Quem está vivo nem sempre aparece Já nem aborrece Quando um bom amigo recusa ser alguém Ai, não fiques refém De empurrar aqueles que ficam parados À espera sossegados No seu canto isolados Netflix, tele-gado A esticar peles virtuais A cultivar ameixas Para gueixas de internet E a tirar cotão do umbigo Estão fodidos É pró menino e prá menina O chicote que avalia A meritocracia Estão fodidos É pró menino e prá menina Rendas para milionários Em gaiolas de canários Estão fodidos Anda trocar o santo pelo signo O dogma é inquilino Da mente que arrendou Deixa lá Quem está vivo nem sempre aparece Já nem aborrece Quando um bom amigo recusa ser alguém Ai, não fiques refém De empurrar aqueles que ficam parados Crânio cativo A pensar dispositivo Comprimidos pelo sonho Incumprido pelos pais Estimado cliente Ansiedade fluorescente Brilha fora da caixa Com ideias triviais Pose de cueca Ai, chove tanta seca Deserto de mirones Com olheiras virtuais O mar plastificado Espeta a mangueira do estado Numa torneira de Legos Para regar os quintais A morder os dentes Das palavras indecentes Que entopem os ouvidos...
7.
Arrebatei o que jurei Não comprar em leilão A fina dopamina Fez-me festas no coração Ao consumir sem resistir Aquilo que me encantou O algoritmo Deu-me o seu abraço de robô Acumulei o que comprei Engavetado no pó E quanto mais tenho Mais me sinto só São coisas que não quero mais Coisas para perder Lixo infiltrado no prazer Coisas que entram pelo mar Coisas sem coração Lágrimas no olho do tubarão A solidão sem direção Obrigou-me a ceder A opinar sem questionar O que estava a dizer O algoritmo aprovou E deu-me a sua mão De polegar estendido Em aprovação São coisas que não quero mais Coisas para dizer Lixo infiltrado no lazer Coisas que entram pelo mar Coisas sem emoção Que choram pelo olho do tubarão São coisas que não quero mais Coisas para perder Lixo infiltrado no prazer Coisas que entram pelo mar Coisas sem coração Lágrimas no olho do tubarão Que choram pelo olho do tubarão
8.
Pensando no tempo que passa Vislumbro um sinal de mudança Sorrio para o gume da faca Como o porco sorri na matança É mais um sorriso forçado Que vejo no espelho do amor E os olhos que ontem brilhavam Parecem buracos sem cor Não tenho medo do que se passa Tenho os miolos roídos da traça Já ouço o homem que ergue a gadanha Dizer A tua cabeça é só teias de aranha E enquanto a memória não passa Vou neste comboio sem freio Saúdo a gente que passa Esticando o dedo do meio E a cabeça gira na cama Na curva espiral do prazer Para uns a vida é fodida Para outros a vida é foder Não tenho medo do que acontece É mais um pouco de mim que apodrece Já sei que o anjo da guarda existe E diz Caga lá nisso, o mundo que se lixe Não temos tempo Senão para olhar para trás E é esse o tempo que nos move Enquanto o mundo nos dissolve Só choras agora que dás pela perda Pois tens a cabeça cheia de merda São estes os olhos do amor Pintados a lápis de cor E a voz da eterna promessa Vai dizendo que isto é doença O anjo virou sem-abrigo Já não quer nada comigo E diz que deus criou o mundo sem falhas Mas tudo o que acontece é ao calhas Enquanto remexo no saco do lixo Diz-me num sorriso Não penses mais nisso Não penses que o pensamento emaranha Mais vale ter o cérebro em teias de aranha

about

credits

released May 5, 2023

Letras e músicas por Daniel Catarino
Produzido por Ricardo Cabral, Daniel Catarino e Manuel Molarinho
Gravado e misturado por Ricardo Cabral no Quarto Escuro, Porto (entretanto gentrificado)
Bateria gravada por Xinês no Évora Recording Studio, Évora
Masterizado por Joel Figueiredo no Slowdriver Studio, Porto

Daniel Catarino: voz, guitarra, teclados em "Olho do Tubarão" e "Fado do Caixão"
Manuel Molarinho: baixo, coro em "Até o Mais Honesto é Guloso"
Xinês: bateria
Francisco Lima: voz em "Sonhos Sem Objectivos"
Rodrigo Pedreira: sintetizadores em "Sonhos Sem Objectivos"
Angelina Nogueira: coro em "Manequim", "Berço de Ouro" e "Teias de Aranha"
Rebecca Moradalizadeh: coro em "Manequim", "Berço de Ouro" e "Teias de Aranha"
Ricardo Cabral: coro em "Olho do Tubarão"
Pedro Pestana e Joel Figueiredo: consiglieri de mistura

Em memória de Fernando Gato e Nuno Espadinha

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about

Daniel Catarino Porto, Portugal

Daniel Catarino é um cantautor alentejano residente no Porto. Em canções que fundem a música de raiz e o rock, aborda os paradoxos da humanidade entre a frieza analítica e o calor poético.
Ao vivo, apresenta-se em trio.

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